Arquivo mensal: fevereiro 2013

Calípso [2/3]

Naquela noite não conversamos muito. Era estranha a sensação de falar com alguém que você conhece, mas que não faz a menor ideia de quem você é. Mesmo sem falar, lá de longe, dá última cama do quarto, ela conseguia a  minha atenção. Ignorando completamente a minha presença, trocou de roupa sem pudores ou dúvidas. Tirou as botas, a jaqueta preta, depois os brincos e o colar, depois o relógio, depois a outra peça de roupa que estava por baixo, depois o cinto, a calça apertada, que deu mais trabalho do que o resto, e vestindo quase nada se agachou próxima à mala para achar peças que, depois, reconheci ser um pijama. Adormeci antes de apagarem as luzes.

Nessa noite não sonhei. Mergulhei num sono preto e pesado, a ponto de acordar no dia seguinte sem nem lembrar da existência de Calípso. Fiquei um tempo acordado olhando o estrado da cama de cima, vazia e arrumada. Pensei sobre a cidade, sobre a viagem, sobre voltar para casa e sobre como era difícil ouvir e entender o alemão das ruas. De repente entendi, sem qualquer dificuldade, um “bom dia” feminino vindo de lá de longe. Animado, cortes e interessado. Toda a paixão desaparecida que o sonho pesado me proporcionara agora escorria descarada pelos meus olhos, boca e poros. Não me lembro se respondi, mas me apressei em sentar na cama e ela, encostada na parede do lado de lá, me olhava e sorria, como quem espera uma reação qualquer.

“Você tá linda”, foi a primeira coisa que eu disse. Não era bem o planejado, até porque nem tinha um plano, mas foi o que deu pra dizer, o que saiu. Ela sorriu um riso curto, daqueles que significam mais do que aparentam. Levantou-se da cama e caminhou descalça sem me olhar. Quando passou pela porta disse, em inglês, que ia escovar os dentes. Eu ainda fiquei uns segundos ali, setado na borda da cama, olhando para o quarto vazio paralisado, pensando porque é que não disse “bom dia” e nada mais. De repente reconheço o som da escova de dente e a vejo reentrar no cômodo. Tem um escovar frenético, ritmado, daqueles que parecem que vão voar os dentes. Sentou-se na outra cama, de frente para mim, com um batom de espuma branca ao redor da boca, o rosto amassado, os cabelos loiros presos para cima e ficou me olhando. Depois de algum tempo, “tô linda mesmo?” perguntou em tom sério e dessa vez quem sorriu foi eu.

Era linda de qualquer maneira, mesmo assim, sem maquiagem, nem modas, nem defesas. Tinha um rosto claro, limpo, como se fosse dourada, amarela, loira por inteiro ou algo assim. Não conseguia disfarçar meu enorme interesse em tentar ver por dentro da gola larga do pijama como era seu corpo, o que tinha por dentro, mas não conseguia. Depois me disse com a escova ainda dentro da boca que eu deveria ficar ali, que voltaria logo, e quando levantou-se percebi que seus peitos se desenhavam com perfeição por baixo do pano. Sem sutiã, sem gravidade, só perfeição e genética. Quando voltou estava animada, falante, me contando coisas, conversando, apontando os peitos para todas as direções e me chamando para ir com ela. “Eu vou!”, não sei onde, nem quando, nem para quê. Mas eu vou.

Saí para escovar os dentes e lavar a cara. No espelho meu rosto era um misto de esperança com derrota plena. Voltei em tempo recorde e ela já estava com outra roupa. Saímos em busca de um café da manhã e não sei se por provocação, ou por instinto, mas ela se agarrou no meu braço e aos olhos de quem passava eramos um casal. Eu queria ser um casal com Calípso, o homem de Calípso, fazer parte da vida dela. Ao menos fazia parte daquele dia, fazia ela rir, fazia companhia a ela e a fazia pensar que, no fundo, talvez, as pessoas valem a pena. Passamos o dia, a tarde e o comecinho da noite completamente juntos, fisicamente juntos, segurando mãos, abraçados, encostados e eu não tinha a menor dúvida de que estava apaixonado.

Bebemos um monte de cerveja quente, ficamos breacos e inconsequentes e, como se fosse um desejo mútuo que nasce em corpos separados, nos beijamos. Mas um beijo com cara de convite, com cara de “era uma vez…”, começo de história. No táxi de volta para o albergue ela me parecia o corpo mais confortável e quente que eu poderia encontrar. Puxava meus cabelos, lambia meu pescoço, errava minha boca e tacava a língua no meu queixo, no meu rosto e a gente se lambia rindo, como se estar com tesão um pelo outro fosse mais brincadeira do que coisa séria. Quando chegamos no quarto já não tinha mais segredo e ela arrancou a blusa de uma vez, ajoelhou-se em cima de mim puxando minha camiseta, mas, de repente parou. Me olhou, sorriu, se abaixou gentil até colar o corpo no meu e sussurrou no meu ouvido. “Preciso te contar um segredo… eu sou duas!” e gargalhamos juntos, para voltarmos aos beijos loucos, à alucinação de estar junto e permanecer assim.

Enquanto transávamos eu não pensava em nada além do que sentia e via. Os peitos, os mesmos de antes, lindos, pequenos e firmes, agarrados ao corpo sem se abalarem com ritmo ou intensidade. Os cabelos, agora menos loiros, mais escuros, cobrindo um sorriso enorme de uma boca quase louca. Não sei dizer se durou dez minutos, dez horas, dez vidas, mas parecia não acabar nunca e eu dava graças a Deus por aquilo. No silêncio, depois, agarrado a ela num encaixe perfeito, perguntei, agora em tom de seriedade, sobre o que tinha me confidenciado antes de tudo. “Você é duas mesmo?”, perguntei, como se “ser dois” fosse uma coisa comum e banal no nosso mundo. “Sou!”, respondeu, tirando os pés da cama e indo dormir sozinha, sorridente, pelada, úmida e quente. “Foi bom ter vocês…” eu disse, antes de me virar e dormir.

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Calípso [1/3]

Eu a conheci durante uma viagem para a Alemanha, enquanto tentava dormir numa cama barulhenta de um quarto coletivo de um albergue em Berlim. Seis camas, só eu no quarto: alegria plena. Mas no meio da noite a luz acendeu, uns barulhos foram se arrastando pelo corredor e eu acordei. Não abri os olhos, mas fiquei prestando atenção nos passos, nos sons, nas vozes e concluí que eram duas ou três garotas chegando. Aí decidi acordar de verdade. Quando olhei, na última cama, lá perto da janela, uma única garota arrumava suas coisas e, quando me olhou, sorriu pedindo desculpas em inglês.

Era brasileira, eu também era e ela gostava de climas frios, estava estudando cinema na França, pegou as férias para viajar para outros lugares e estava sozinha na jornada. Eu também. E conversamos até amanhecer. Quando eu saí ela estava indo dormir e depois passei o dia todo pensando nas coisas que ela falava, em como ela falava, na cor do cabelo e nos dentes que tinha. Eu estava ficando obcecado por alguém que bebia a mesma língua que eu, mas não tinha nome. Eu não tinha perguntando o nome.

Mas ela sabia o meu. Eu só sabia que tinha olhos expressivos, um corpo fino e delicado, uma mala maior que o mundo e que gostava de estar comigo. Ela disse isso: “gosto de estar com você” e por alguns segundos fiquei pensando se já nos conhecíamos ou se era uma forma estranha de dizer “gostei de te conhecer”. No fim da tarde voltei, cortando minha agenda do dia pela metade só para reencontrá-la. As coisas estavam lá, a mala gigante, as roupas, mas ela não. Deitei, apaguei as luzes e esperei.

À noite ela chegou. Estava diferente, com ares diferentes, um andar diferente e, por incrível que pareça, um corpo meio diferente. Eu me levantei e perguntei como tinha sido o dia, em português, assim, na lata e ela franziu a testa assustada. Me olhou de dentro da jaqueta de couro e por trás da maquiagem no rosto me perguntou em outro tom: “como você sabe que eu falo português? E quem é você?”, perguntou, nervosamente séria. No início me pareceu piada, depois foi ficando constrangedor até beirar o medonho. Por instinto, puro instinto, disse meu nome, disse que era brasileiro, disse que tínhamos conversado na noite anterior e perguntei o nome dela.

Fez cara de quem sentiu vergonha, sorriu, disse que não se lembrava da noite anterior e ficou me olhando. Mas não como quem olha alguém esperando palavras. Me media, me contava em centímetros, metros cúbicos, cores, cheiros, texturas e no fim, sorrindo para algum lugar perdido entre meu queixo e meu pescoço, disse macia: “Meu nome é Calípso!” e meus joelhos falsearam por um instante. CA-LÍ-P-SO. Soletrei lentamente em pensamento e senti que era um orgasmo em forma de nome. Começava forte, firme e com a boca aberta. CA! Depois seguia com a língua fazendo força contra o céu da boca, pressionando a ponta entre o dentes de cima. LÍ! Aí vinha o ápice, a gozada das estrelas com o toque sensível, mas poderoso e seco, dos lábios que só uma consoante muda pode proporcionar. P! E depois um relaxamento tranquilo e minguante no SO do final. “Calípso eu te amo”, pensei, e ela sorriu, como se tivesse ouvido.

… continua.

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Preto

Era uma presença negra, coisa preta mesmo, perdida no meio da escuridão, me esperando chegar perto para me comer. Ia me comer de qualquer jeito e eu torcia muito pelo “good way” da coisa, afinal, àquela altura, com o medo e o tesão que eu estava, dava pra acreditar em morte e sexo na mesma proporção. A casa era minha, o campo de batalha era meu, mas com ele eu me sentia tão vulnerável, tão insegura, a ponto de ter medo de avançar dentro da escuridão familiar da minha própria porta de entrada. “Não acende a luz!”, disse, e eu obedeci hipnotizada.

Com uma mão na minha cintura, um passo atrás de mim, me guiou para dentro apartamento gelado como se me conhecesse, como se soubesse da minha casa, do caminho para o quarto, ou o banheiro, ou que a água fica na porta da geladeira e os copos estão na terceira porta da direita para a esquerda do armário. Sabia tudo ali, inclusive, que eu ficava completamente mole com gente me segurando firme pelo quadril. Era muito escuro estar com ele, se é que escuridão pode ser um sentimento. Eu pensava que ele podia ser um assassino, um ladrão, um sequestrador, um estuprador e em todas as opções o meu tesão não diminuía. Era preto o mundo ao redor.

Quando a porta se fechou pude me dar conta de como minha casa era escura. Não conseguia ver nada e mantinha um mínimo senso espacial por saber onde as coisas costumavam ficar, mas não via. Jurava que mesmo à noite entrava alguma luz pela janela da sala, mas não. Era ele, apagando tudo, até as coisas do além, tornando meu mundo um pretume sólido e fosco para onde, totalmente movido por intuição, ele me levava. Eu já não acreditava como ele sabia o que estava fazendo, para onde estava indo e, principalmente, em como estava fazendo tudo certo. Talvez a escuridão fosse só para mim e ele, já sendo escuro e sombrio, pudesse ver com exatidão o que se formava à nossa frente.

Reconheci o cheiro do meu quarto e ali meu corpo amoleceu. Não teve conversinhas na sala, não teve um bom vinho na cozinha, não teve uns beijos na parede do corredor, nem uns amassos no batente da porta. Eu estava no meu quarto, com um cara que eu tinha conhecido algumas horas antes e tudo que minha mente podia processar era a vontade incontrolável de fazer sexo com ele. Era só isso que me preocupava. Tinha medo que ele fosse daqueles sadomazoquistas que gosta de ficar batendo, amarrando. Não pela dor, mas pelo sofrimento de ficar perdendo horas e horas de puro sexo para alimentar uma tara. Eu hoje não queria beijo na boca, não queria palavras ao pé do ouvido, não queria, talvez, nem preliminares. Eu queria dar!

E então, como numa mágica, meus pensamentos fugiram para fora de mim, saindo por algum ponto do meu corpo e flutuando em letras vermelho-neon pelo quarto. Iam se grudando nas paredes em uma porção de frases prontas. Eu pensava e automaticamente uma linha cursiva e delicada ia escrevendo meus pensamentos no teto, nos cantos das paredes, na cabeceira da cama e ele, escuro até o talo, absorvia cada sílaba. O que aconteceu depois é difícil explicar porque está naquele limiar que gira em torno da alucinação, da completa loucura, do sonho e da realidade extrema. Mas eu dei. Ou melhor, ele tomou de mim, sem chance de reação, nem de rebobinar a fita, voltar os capítulos, não tinha mais volta.

Me puxava os cabelos como se quisesse arrancar minha cabeça do corpo, acabava com qualquer traço de vaidade do meu corpo e investia para dentro de mim como se quisesse me varar, sair do outro lado, me rasgar ao meio. E tudo isso porque eu queria. Estava escrito nas paredes, estava saindo de mim e eu já não pensava mais, era só impulso e instinto. Às vezes é preciso deixar a princesinha interior lá fora, na rua, longe de casa e deixar a ninfomaníaca selvagem tomar conta. Eu queria trepar, daquele jeito que ninguém tem dúvida, ninguém precisa explicar e ninguém consegue repetir. Pra ele, com ele, dentro daquela escuridão, eu daria até a alma sair andando. Numa definição bem banal e simplória, me comia como uma puta barata. Mas aquelas putas que pedem mais, que instigam o cara, que fazem de tudo pra que ele peça pra parar, que diga que não aguenta mais.

E eu, agora tomada por algum espírito maligno, não queria mais parar. Falava absurdos, pedia coisas impensáveis, sentia  partes do meu corpo que eu nunca soube que existiam, apanhava igual uma escrava e sorria, às vezes até gargalhava e berrava tomada por uma loucura que não era minha. Não sei se desmaiei ou dormi, mas em algum momento ele foi embora, acabando com a loucura, terminando meu exorcismo e levando aquele pretume todo, deixando a luz aparecer. E já era dia. Acordei destruída, com o corpo roxo em lugares enigmáticos, como as canelas, os braços, os ombros, e com dores estranhas e intensas, que vinham de dentro e passavam para fora, como se estivesse sendo castigada por mim mesma. Naquele dia não levantei da cama, criando coragem para entender o que é que tinha acontecido e esperando, ressentida, vir a noite, para escurecer tudo de novo.

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Na dúvida, vá de sexo!

Dá pra falar que um relacionamento é 50/50 entre amor e sexo, mas na real todo mundo sabe que nem sempre a divisão é certinha assim. Pensei nisso depois que uma amiga veio me falar que estava com saudades do ex-namorado, que sentia falta não do namoro todo, mas de alguns momentos, alguns hábitos que vão embora junto com a outra parte do casal que a gente manda à merda. Ela disse assim: “Sinto falta das coisas com ele. Queria ter ido à aula com ele hoje, e depois ter vindo aqui pra casa , ter tomado banho com ele e ter transado loucamente… e depois dormir gostoso”, assim, numa naturalidade invejável.

Os puritanos que me perdoem, mas a parte do “transar loucamente” é o ponto alto disso tudo. Não? Porque depois, quando você já está em carreira solo, quando a solidão já está deitada no sofá de casa, comendo tudo que tem na geladeira e bagunçando todas as músicas do seu iTunes, parece que coisas simples como dar uma fodinha de leve no chuveiro são os melhores momentos da vida. Não são, ok, mas parecem e o que importa é isso. Então vem me dizer que está sentindo falta do amor, vem. Tá nada! Tá sentindo falta da companhia, talvez, mas não sente nenhuma falta das brigas, nem da pouca privacidade, nem dos momentos de ciumes idiota. Agora pergunta se sente falta de tomar uma pegadinha na bunda na hora do café da manhã. Claro que sente!

O sexo é o adubo da plantinha do relacionamento. O lance é que, quando a plantinha morre o adubo ainda presta pra outras sementes. Sexo é a parte mais divertida de se misturar com alguém, seja lá o grau de intimidade que essa mistura vai criar. E tem todo o lado da intimidade, que é tesão puro de cabo a rabo. É você manipular as entranhas de alguém, dominar o corpo com um toque, deixar os sentidos todos embaralhados com quase nada. E quando digo “sentidos embaralhados”, tô falando sério. Quando a visão não funciona bem, quando a gente respira em descompasso com o coração, quando arremessa as coisas, faz caretas sem explicação e fica mais tempo de boca aberta do que fechada. Você sabe, né? Vai tudo saindo do eixo.

E aí a gente tem a cereja do bolo: o orgasmo. Essa coisa linda, cósmica, transcendental e muito úmida e viscosa. Tem pouca coisa melhor do que gozar junto, naquele frenesi maluco de gente entrando e saindo e todo mundo suado, se agarrando e contraindo músculos até beirar o colapso. Não é atoa que a cultura hindu compara o orgasmo à morte. Quem é que não pensa que não vai morrer depois de uma bela gozada pra ninguém botar defeito? É quase como trocar de alma com o outro, é invadir alguma coisa além do corpo, acho que se tivesse uma maneira de medir a energia espiritual e cerebral gerada pelas relações sexuais, elas estariam sendo comparadas a explosões de pequeno porte.

E depois disso tudo o pessoal vem me falar que sente falta do amor. O amor é o nome que a gente dá pras risadas de cumplicidade, pras promessas que a gente nunca sabe se vai cumprir, pra mão que fica mexendo no nosso cabelo durante o filme. E isso é incrível, claro que é, não vou ser hipócrita. Mas o sexo, esse não é nada além dele mesmo. Sexo é aquilo e pronto. Na verdade é TUDO AQUILO e pronto. Como eu disse, é o desejo físico, é o tesãozinho reprimido na presença da família, é a coisa toda escondida no banheiro da balada. Faz todo sentido sentir falta do sexo: ele é único, pessoal e intransferível. Afinal, ninguém trepa igual ao outro, acho.

É por isso que a pegadinha na bunda é tão importante, que a encochada no banho é tão importante, que a lambida na nuca é tão importante, que as mordidas nas costelas são tão importantes, que as gemidas no ouvido são tão importantes, que as gotas de suor descendo a coluna são tão importantes, que os gritos, os xingamentos e os tapas de amor são tão importantes, que as pernas e braços entrelaçados são tão importantes. Sexo é mais importante que o resto. Mesmo que não seja tudo, na dúvida, investe nele!

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Dê a cara para a rua

Quanto demora pra a gente perceber que as coisas realmente acontecem? Eu não sei. O que eu sei é que eu sempre fui dos que amava o discurso do “faça o que você gosta que o dinheiro vem”, mas que nunca botou em prática. Eu gosto de escrever crônicas, históricas, contos, invenções da vida. É isso que me da prazer, que me livra a mente. Também gosto de tocar violão, de fotografar meus amigos, de andar de bicicleta, de comer doce de leite, mas acima disso tudo, gosto de escrever. Mas vivendo no Brasil, um país que valoriza tudo, menos a cultura  e o conhecimento local, é difícil ser escritor.

Mesmo assim, como já postei aqui há alguns dias, algumas coisas bem legais estão acontecendo ao redor dos meus textos e acho que com um pouco de empenho a coisa vai. Ah se vai! 2013 é o ano que eu escolhi para realizar, fazer acontecer e crescer. É o ano de promover meus projetos, todos eles, tirar tudo do papel e fazer as coisas tomarem forma. Hoje, com a estréia do meu texto no site do Casal Sem Vergonha, ganhei mais um pedacinho da batalha: meu nome foi pro mundo. Mais de 1.000 curtidas no texto em menos de 5h. Não sei quantos milhares de leituras, foi bom!

Mais do que bom, foi real. A realidade abre os olhos, enche os pulmões e faz as coisas se moverem para frente. Hoje eu percebi que com um pouco de insistência tudo dá certo. Não subestime seus amigos, não deixe ninguém de fora das suas novidades e persista no que você faz melhor mesmo quando ninguém está vendo. Você não sabe, mas estão vendo! E aí as novidades vão se juntando como blocos, vão crescendo, evoluindo e quando você piscar já vai ter se formado um negócio muito legal, bonito e o melhor: com a sua cara.

Parece auto-ajuda, mas no fundo é só conselho de brother. Não tenho meu livro publicado, não estou dando entrevista em blog cult, não estou ganhando dinheiro com isso, mas estou feliz. Estou satisfeito por ter começado, empolgado por poder continuar e feliz por ter acreditado. As coisas acontecem, pode acreditar. E pensando nisso fica fácil transportar essas lições para tudo na vida. É igual gente que quer muito um namorado, mas não sai de casa. Gente que quer muito ficar com uma pessoa X, mas não se impõe, não se apresenta. O jogo tem que ser jogado, não assistido. Dê a cara para bater, apanhe muito, mas vai com fé. Uma hora acontece!

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Vai ver eu não sei nada…

– na hora do “vamo vê” eu desenho uma xícara enorme, girando alada, e confirmo a história pra quem duvidar!

Quem sabe tudo sobre amor levanta a mão agora! É, pois é, né? Já deu, não dá pra saber, eu sei que não, e já não me aguento escrevendo como se soubesse. Eu não sei quase nada sobre relacionamentos, sobre o amor de verdade, sobre o amor de mentira ou, simplesmente, se existe amor. Eu acho que existe, mas como é que eu vou provar? Não posso ficar aqui cagando regra, falando sobre como caras tratam as mulheres mal, como mulheres perdem o controle de seus relacionamentos largando os parceiros à míngua. Isso é falsidade, deveria ser proibido.

No mínimo uma vez por mês eu sinto medo. Daquele medo verdadeiro, que pega a respiração no meio da frase, que acelera o coração, dilata a pupila e não deixa a gente fazer mais nada. Sinto medo de ficar sozinho, de ser sozinho, de não segurar a barra da solidão, porque ser sozinho é pros fortes e a gente vive num mondo de gente covarde. Eu sou e você também é, não adianta se isentar ou ficar brava(o) comigo. Você também se borra de medo de ficar só. Tem gente que diz que já se acostumou, mas é mentira. Não existe criação feita para ser singular, somos feitos para estar junto, é da nossa natureza.

Passo horas escrevendo sobre mulheres fatais, ninfomaníacas, ou sensíveis, frágeis, quase dignas de dó, e no fundo boto tudo numa embalagem de literatura nova, de coisa de blog, de ideia de gente na flor da idade. Tudo errado, tá tudo errado nisso aí. A maior mentira que eu conto pro mundo são as minhas próprias mentiras. Quase não invento ninguém, quase não tenho personagens. É tudo gente sofredora que eu vejo por aí, que eu conheço em segredo, lendo o jornal do cara do lado, olhando o casal do fundo do vagão, ouvindo a conversa alheia no balcão da padaria. Essa gente toda existe, lógico que existe, porra. Você sabe que não tem literatura ficcional sem fatos reais.

Penso muito sobre os casais que acabaram. Penso sempre neles. De amigos, de conhecidos, da família, dos filmes. Aqueles casais que se afundam numa vontade inútil de se vingar, ou daqueles que ficaram tão distantes, tão alheios que, antes do fim, já se sentiam solitários. Penso sempre naqueles casais que ficam no silêncio, que cultivam cânceres gigantescos só para não criar atrito. Ou aqueles pares que simplesmente querem acabar com a vida alheia, que apagam toda a história de amor e só conseguem focar no que foi ruim.  As pessoas não sabem mais lembrar do que foi que elas ganharam em uma relação, mas também não conseguem esquecer o que foi que perderam. Quem é que sai ganhando quando os dois perdem juntos? Diz pra mim.

Sinto falta dos cigarros. Os cigarros que eu botava meus personagens para fumarem por mim, que nunca tive pulmão bom pra essas coisas. Toda vez que eu escrevia uma história onde o protagonista fumava, me sentia fumando junto aqui, sentado nessa mesma cadeira, nesse mesmo quarto quente, escuro, alheio à arquitetura do resto da casa. Ninguém faz ideia de quanto tempo eu levo para escrever uma coisa dessas, mesmo quando saio dizendo por aí que o texto veio de uma vez. Mentira. Veio de uma vez porque passei o dia pensando nisso, porque tomei três cafés da manhã na mesma padaria dizendo pra todo mundo que comi uma vez só. Ninguém sabe que eu tomo três banhos por dia porque é mais fácil pensar com o chuveiro ligado. Eu penso muito, o tempo todo, contra a minha vontade. Eu penso o tempo todo nos casais que se acabam, depois penso em mim no lugar deles.

No fundo faço isso porque tenho medo. É mais lucrativo aprender com a desgraça alheia do que com a nossa própria. Não quero ter que sofrer pra aprender, nem apanhar pra aprender a bater. Quero o caminho mais fácil, ué? Quem não quer? Tenho ouvido muito uma música nova que diz assim: “Eu não quero te passar uma impressão errada, mas eu preciso de amor e afeição. E espero não estar soando muito desesperado, mas eu preciso de amor e afeição”, e ouvir esses versos me faz pensar que ninguém está pronto para pedir amor, até porque ninguém entende bem como é que o amor funciona. Então, na dúvida, quando a gente consegue um, o negócio é se cagar de medo de perder e continuar vivendo na corda bamba. Amar não é seguro pra ninguém, mas louco é quem não se arrisca.

Vai ver tudo isso seja só uma tentativa simples, ou complicada, de dizer que o mais do mesmo nunca sai de moda. Falar sobre amor é lucrativo, rende e instiga, porque é sempre assunto novo, é sempre coisa que o povo não conhece bem. Assim como as reportagens com dietas são escritas por gente gorda (e eu sei o que estou dizendo), os livros, as músicas e os filmes de amor são sempre escritos pelas pessoas que menos sabiam o que era realmente amar. Vai ver eu também, assim como um monte de gente, não sei merda nenhuma e esteja atirando no escuro assim, a esmo, torcendo para acertar uma vez ou outra. Deve ser isso.

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O fantasma de Mãe Ísa

Charlatanice a gente encontra em qualquer lugar, ainda mais nesses assuntos. Vidente, búzios, tarot, amarração do amor e todo tipo de “mágica” para todos os fins. Não, não é de oportunismo que vou falar. Não gosto de ser enganado, ninguém gosta, principalmente se envolve dinheiro, afinal, ainda não inventaram um pé-de-grana pra galera plantar no fundinho do quintal. Tô falando de coisa boa, coisa fina, milimetrada, sem erro, sem lenga-lenga, sem putaria. É vidência de primeira!

Conheci meio que por acaso no ano passado, quando a minha vida estava mais bagunçada que arquivo de repartição pública. Era eu entornando o caneco de quinta a domingo, me enfiando em rolês sem pé nem cabeça, conhecendo gente que não tinha nada a ver comigo e torrando dinheiro numa velocidade recorde. Estava perdido no mundo e sem nenhum mapa que me ajudasse a voltar, seja lá pra onde eu deveria voltar. Foi nesse cenário hostil que ela apareceu.

No começo eu não acreditei. Quem é que acredita em vidente assim, de cara? Se os jornais estão lotados de notícias sobre o possível novo Papa e o povo nem acredita em Deus, porque é que vão dar crédito pra gente que diz saber o que vai acontecer, mas não está rica milionária pra caralho. Eu também duvidei, mas fiquei de olho, meio de longe, acompanhando o povo que ia lá, que ouvia os conselhos, que era atendido e saia de lá sabendo mais sobre si mesmo do que quando entrou.

Lá pra junho eu decidi dar ouvidos e ver o que ela tinha para mim. Mãe Ísa, pros íntimos, vidente Mãe Heloísa da Estrela no cartaz. Fazia de tudo e eu duvidava de 100% do conteúdo, mas tinha me fé e torcia para estar errado. Foi preciso apenas uma visita para ganhar minha atenção. Fala por línguas diferentes, em timbres que não pareciam ser dela e depois de uma hora de uma conversa completamente estrangeira saí.

Atravessei a rua, sentei num banco alto no balcão de um boteco fantasiado de lanchonete e pedi café com leite no copo americano. A cada gole que descia pela garganta uma frase era traduzida. Mãe Ísa falava em códigos para serem traduzidos depois, com calma. Naquele balcão sujo eu entendi que o futuro era viver da mentira que os outros contam sobre mim. Difícil, considerando o número de versões das mesmas histórias.

Caminhei para casa pensando naquilo, lembrando de tudo que já inventaram e, logo em seguida, numa topada com um paralelepípedo fora do lugar me surgiu a voz da vidente dizendo que eu era louco, má companhia e que não era confiável. Ela dizia “fuja, saia de perto, afaste-se e não volte mais a se ver. Corra de você, não deixe que você se encontre de maneira alguma”, e no instinto comecei a correr.

Na corrida, depois de quase ser atropelado por um ônibus, traduzi as palavras de Mãe Ísa que me diziam que eu precisava finalizar essa “presença”, eu precisava dar um jeito de acabar comigo para poder viver em paz, sem me ter por perto, sem ter que ver meu rosto por aí. Eu precisava dar cabo de mim porque “não existe mudança de gente como você. Ou morre e nasce, ou vive e continua atrapalhando a vida alheia”, e comecei a planejar um jeito de me acabar.

Chegando em casa, quase me acabando em faltas de ar, corri para o telefone e corri os nomes possíveis para quem eu poderia ligar e falar sobre o que estava acontecendo. Mãe Ísa agora parecia uma alucinação, encostada no batente da passagem para a cozinha, me olhando de braços cruzados, toda castanha, toda seriedade e a única coisa que pude pensar foi em ligar para mim mesmo. “Alô, cara, tão tentando me convencer a acabar com você!” contei, como uma bala que sai sem volta, de uma vez, sem rodeiros.

Aí fiz um silêncio misteriosamente calmo do outro lado da linha, enquanto eu aqui, esbaforido, morrendo, esperava qualquer resposta ou sugestão. Então Mãe Ísa começou a falar sozinha, trepada nas minhas costas, agarrada ao meu pescoço com a boca colada à minha orelha: “você é maluco, você não vale nada, você é um risco, você é uma mentira, Você é um estorvo, você é um encosto, você é uma sombra, você é ruim, ruim ruim, muito ruim”, e eu tremia. Então, pelo telefone eu disse para mim com calma e convicção: “Mãe Ísa não sabe de nada, quem sabe sou eu!”, e aí eu acordei.

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O plano dos dias

Tempos atrás a Marianna Parro – ou só Parro, na minha cabeça – me atiçou com uma ideia tentadora: escrever um livro. Não é novidade, não é de hoje que eu ensaio tentar fazer alguma coisa do tipo, mas dessa vez parece um pouco mais sério. De lá da Espanha, onde minha querida e desaparecida amiga tem passado os últimos meses, ela me perguntou se eu não queria organizar meus textos, tentar produzir alguma coisa original e caminhar para o que seria um livro de verdade. Eu gostei!

Parro será minha conselheira editorial, além de ser minha editora, minha atravessadora, minha guru e minha babá nessa jornada rumo ao primeiro título. Ela vai cuidar dos meus personagens, das minhas aventuras, dos meus devaneios e da minha ortografia, que nunca foi grande coisa. Nunca, antes dela, ninguém se preocupou em me guiar pro caminho da luz literária. Agora, quando o tempo sobra, é pro livro que eu escrevo, por isso o ritmo de produções aqui no blog tem caído.

Ao mesmo tempo, uns dias atrás, inspirado pela ideia de escrever o livro e ter meus textos em papel, decidi que distribuiria contos por aí, entre alguns amigos que gostam de me ler. Decidi que ia separar os melhores contos, as coisas mais finas que eu escrevi nos últimos seis meses e reeditar para ficar alinhadinho. Acertei que ia imprimir em papéis bonitos, assinados à mão atrás, numerados, para comprovar que são reais e exclusivos. Depois, então, ia mandar por correio, cartinhas de pura dedicação pra gente que dedica tempo lendo o que eu escrevo. Vou mandar pra uns 16 amados que moram muito fundo dentro do meu coração, mas não se sinta menor caso seu nome não esteja entre esses: é só um começo. Esse projetinho está em processo de finalização, amém!

Mas uns dias atrás, também numa conversa sem nenhum objetivo preciso, a Isadora Garaventa – ou Isa, como todo mundo conhece – me disse que eu deveria tentar transformar um dos meus textos em um roteiro de curta pra TV ou cinema. A sugestão veio de quem tem o nome misturado na co-autoria de séries como FDP (muito foda, assista!) da HBO e Oscar Freire 279 (idem) da Globosat, então não ignorei. Combinamos de escolher alguma coisa do meu blog, algum texto que fosse fácil de trabalhar e, qualquer dia desses, ainda vamos sentar para falar igual gente grande sobre isso.

Enquanto gasto os dias tentando terminar um freela gigante e com prazos suicidas; pensando em cursar técnico em Design de Interiores no Senac; planejando pegar minha câmera e sair fotografando amigos e amigas que têm talento pra ficar do outro lado da lente; montar e estruturar uma fábrica de longboards e viver da diversão e da adrenalina alheia; curtindo chamegos, carinhos, risadas e jantares com a Juh, minha namorada, tenho pensado que meu maior tesouro para o mundo é mesmo o que eu escrevo. Que bom que, de repente, “alguéns” começaram a perceber isso.

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Silly

Não vou bancar o ingênuo e dizer que sei tudo, que estou com o plano todo na cabeça, que “agora vai”, porque seria ridículo. Não precisa muita inteligência nem habilidade de observação para perceber que eu estou tremendo de medo. De você, sim, claro, evidentemente. Qual é o homem que não tem medo de você, mulher segura de si, decidida, imponente. Eu me cago, não tenho vergonha de dizer, porque é meio machista pensar que o homem tem sempre que dominar a relação, sempre tem que ser a figura que passa segurança, o mais centrado dos dois que compõem o casal. Com você não dá.

Então prefiro assumir de vez que você é intimidadora. A aura toda que te envolve me parece muito surreal. Essa música que desde que começou a tocar eu não consegui decidir se é lenta ou rápida. Esse cara dizendo “no, don’t be a silly boy” parece estar falando comigo e eu fico confuso se devo responder ou só aceitar o conselho. Eu não quero ser bobo, mas a julgar pelo meu espanto e pela cara ridícula que eu devo estar fazendo agora, não tem adjetivo melhor. E eu sei que você gosta, que você arma esse showzinho psicológico porque te dá prazer. Vai ver você é a viúva negra me seduzindo para me matar e engolir meu resto no final. Eu deixo, estou super ok com isso.

Me surgem perguntas mais ingênuas e ridículas do que o meu próprio comportamento. Vejo você dançando discretinha, com movimentos mínimos, com essa calcinha bonita combinando com o sutiã bonito e fico pensando: será que você usa sempre o mesmo conjunto com todos os caras? será que você já fez essa cena pra outros caras? será que você gosta de mim? será que você está tentando me seduzir para se afirmar? será que você espera que eu faça alguma coisa? será que eu vou atender às suas expectativas? será que você tem alguma expectativa? o que será que eu tô fazendo aqui? E a música continuava tocando, você continuava dançando e eu continuava acuado.

Essa poltrona onde eu estou sentado, agora se parece com um sofá de três lugares e eu me sinto pequeno. É intimidador estar aqui, vendo isso, vendo você, querendo você sem ter um pingo de coragem para mover um dedo sequer. Tento relaxar prestando atenção no seu desenho, uma arte final de finos detalhes, riscada com perfeição, curvas feitas com precisão, cores e tonalidades da melhor paleta de cores que puderam arranjar. Você é uma perfeição estranha, daquelas que a gente duvida, que se contarem a gente dá risada. É quase proibido procurar as tuas falhas.

Então a cena congela, eu me perco alucinando sobre como deve ser a sensação de tocar você, apertar você, grudar-me em você e friccionar até abrir chama. Fico fantasiando sobre o gosto do seu perfume no fundo da minha língua, sobre a textura dos seus cabelos enrolados no meio dos meus dedos, sobre a sua voz, o seu olhar e, quando menos espero você está parada, de frente para mim, com as mãos na cintura e a música acaba de recomeçar. É um repeat torturante do mesmo som hipnótico, com a mesma paisagem atordoante e o mesmo medo do início. Eu devo ser o cara mais ingênuo que já sentou nesse sofá. Com certeza sou, seu olhar não mente. É por isso que eu estou aqui.

 

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